Defesa Nacional e Defesa Social

Em época de eleição, dentre as propostas de candidatos, já virou quase uma praxe o compromisso de enxugar a máquina pública, começando pela redução do número de Ministérios e de Secretarias, na esfera federal e na estadual, respectivamente.

Minimamente, isso seria feito através desidratação da atual macroestrutura e/ou desaparelhamento, isto é, dispensa de apaniguados, de pupilos, de protegidos, de afilhados de certos políticos que são “donos” de certos cargos em alguns órgãos do Executivo, tidos como sinecuras, mamatas, “bocas”. Certamente, se se substituir esses protegidos (maioria despreparada para exercício de funções públicas) por metade de técnicos, o ganho estatal será enorme.

Outra forma é a extinção de órgãos, tornando a estrutura bem leve, caminhando para o denominado Estado mínimo, em substituição ao pesado Estado promotor do bem-estar social. A grande dificuldade, para realizar essas mudanças, é a falta de convicção de que determinadas atividades públicas, se e quando transferidas para a área privada, terão mais efetividade, ou seja, mais qualidade dentro dos objetivos institucionais.

Visando à discussão da oportunidade de uma reestruturação, dentro do espectro de atividades inerentes à área governamental, vamos restringir-nos à que é conhecida como “segurança”, percebida como uma ação, um produto que gera a paz e a harmonia. Na verdade, um equívoco, se se vir o Estado sob o ângulo de que existe para promover o progresso, nacional e social, através ações de desenvolvimento, e para prover a proteção, nacional e social, através ações de defesa. Estas últimas visam a identificar vulnerabilidades e a mitigar/eliminar ameaças à Nação e à sociedade. Sintetizando, segurança é ambiente, decorrente de ações de defesa, em que vulnerabilidades e ameaças estão controladas e há crença de que isso está ocorrendo. Complementando, um ambiente utópico!…

Observe-se que, no Brasil, para realização da salvaguarda (um braço do provimento da proteção nacional e social), merecem destaque, dentre outros, os atuais Ministério da Defesa, Ministério da Justiça, Gabinete de Segurança Institucional e Ministério Extraordinário da Segurança Pública. Que poderiam ser um (Ministério da Defesa ou, melhor, Ministério da Salvaguarda por ser mais específico), cuja capilaridade começaria com duas artérias: Defesa da Salvaguarda Nacional e Defesa da Salvaguarda Social. O recém-criado Conselho Nacional de Segurança Pública (melhor seria Conselho Nacional de Salvaguarda Social) poderia ter sua missão ampliada, nos moldes dos atuais CNJ e do CNMP, encarregando-se da coordenação nacional dessa atividade, em paralelo ao já constitucionalizado Conselho de Defesa Nacional. Razoável pensar-se na fusão desses dois conselhos, dando origem ao Conselho Nacional de Defesa. Importante e necessário é que a interação entre as forças públicas federais e estaduais seja mais efetiva, considerando que o grande compromisso dessas instituições é com a Ordem nacional e social, respectivamente, observadas suas variações (normalidade, alteração, perturbação, grave perturbação, luta interna). Aliás, mais uma das formas de enxugamento é ampliar e acelerar o fluxo de informações, dentro do sistema de defesa, visto que, atualmente, as instituições integrantes trabalham quase que estanquemente, ainda que, conforme a doutrina, deveriam operar solidariamente. A falta de sincronia e a descontinuidade podem ensejar que problemas de defesa social, mal resolvidos, reflitam na defesa nacional.

É provável que a Estratégia Nacional de Defesa (END) será revista (última atualização foi feita em 2016), pois, atualmente está contemplando uma estratégia de defesa nacional, privilegiando apenas uma vertente (e a outra, a defesa social?) e, ainda, com ênfase no campo militar, olvidando o econômico, o psicossocial, o político e o tecnológico.

Certamente, a inclusão da defesa social na END ensejará a pesquisa, a concepção e a divulgação de Políticas Públicas, para trabalhar causas, causalidade e efeitos de vulnerabilidades e de ameaças ao corpo social, através diretrizes para ações objetivas.

Na esfera estadual, é extremamente importante que os órgãos de defesa social tenham autonomia administrativa, financeira e operacional, sob a coordenação de uma única secretaria ou do Conselho Estadual de Defesa Social (que, além de atribuições consultivas, receberia missões executivas, após sair do CTI em que se encontra), uma alternativa melhor que o atual Colegiado de Segurança Pública, principalmente porque o vice-governador é o presidente daquele, o que aliviaria a carga do governador.

Uma percuciente análise da Seguranca Pública (expressão utilizada restritivamente, hoje em dia, para referência apenas à criminalidade violenta) digo, da Salvaguarda Social (expressão mais ampla, referindo-se à defesa contra vulnerabilidades e ameaças ao corpo social, exceto a exclusão social) certamente indicará que nebulosidades, mormaços, lodo, envolvendo esse tema, ocorrem por falta de autoridade para conduzir sua análise, expedir diretrizes, coordenar operações e controlar resultados de cada um dos órgãos envolvidos, cumprindo sua missão constitucional específica. Vale dizer, dar autonomia para que instituições policiais planejem e executem seu trabalho específico, interagindo (sem entrar na área de competência alheia), sob a tutela de um órgão harmonizador de esforços.

Cel Amauri Meireles

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