ARTIGO ACÍLIO LARA RESENDE – AS REDES SOCIAIS NÃO PODEM SE TRANSFORMAR EM DESAGUADOURO DO ÓDIO

                            Em artigo publicado na “Folha de S. Paulo”, neste último domingo, sob o título “Afronta à dignidade humana”, o médico cardiologista e professor titular da Faculdade de Medicina da USP, também diretor do Hospital Sírio Libanês, Roberto Kalil Filho, criticou “a divulgação, pelas redes sociais, de exames e dados clínicos não autorizados, além de comentários desairosos sobre pacientes públicos”.

                            Roberto Kalil não citou nomes, mas um dos “pacientes públicos” é a ex-primeira dama Marisa Letícia, falecida na última sexta-feira, vítima de um acidente vascular cerebral. Essa divulgação terminou em demissão de uma jovem médica, cujo nome não me lembro agora: “Médicos que profanam o princípio do sigilo e do respeito devido a qualquer ser humano devem ser punidos de forma exemplar”, disse Kalil, referindo-se à quebra do juramento de Hipócrates a que todo médico está sujeito quando recebe o título de doutor. Em sua defesa, a médica alegou que o assunto foi tratado, apenas, entre alguns dos seus colegas.

                           Pergunta-se: por que, então, o uso das redes sociais?

                           Pertenço a uma geração de jornalistas que, no início, teve dificuldades para apreender e, depois, aceitar e conviver, botando-as em prática, com as novas tecnologias referentes, principalmente, à informatização. Quando esta deu seu primeiro passo, ainda trabalhava no “Jornal do Brasil”. A ansiedade, no início, foi geral. Aos poucos, depois de mais ou menos dominadas, essas conquistas se mostraram de fato extraordinárias. E mais extraordinárias ficam a cada ano que passa.

                          Por outro lado, porém, tais conquistas levaram a um exagero, por exemplo, no que diz respeito às redes sociais. Estas, contraditoriamente, e não raras vezes, ao invés de aproximar mais as pessoas, as estão afastando do contato humano, pessoal, até mesmo na família, e, mais do que isso, estão se transformando em veículo ou desaguadouro do ódio. Cada um se acha no direito de dizer o que quer contra quem quiser, esquecendo-se de que pode estar praticando crimes. O tratamento dado por alguns, nas redes sociais, à morte da ex-primeira dama Maria Letícia, bem como ao ex-presidente Lula, pode não constituir crime, mas é demonstração de desrespeito ao ser humano e, pior, em momento de dor, que deveria levar à compaixão, não ao ódio.

                            O que digo nada tem a ver com o que possa ter feito de errado, na Presidência da República, o ex-presidente Lula, que responde a cinco processos na Justiça. Cabe à Justiça, só a ela, julgá-lo.

                            O abraço do ex-presidente Fernando Henrique ao ex-presidente Lula, ainda no Hospital Sírio Libanês – uma lição de política, segundo o historiador José Murilo de Carvalho, merece elogio pelo exemplo que ambos nos deram. O mesmo, porém, não se pode dizer do líder petista, que extrapolou os limites, em discurso, ao dizer, referindo-se à ex-primeira dama (e sem sequer nominá-los), “que os facínoras deveriam pedir desculpas a ela”. E completou, em tom de comício: “Este homem que está enterrando sua mulher não tem medo de ser preso”.

                            Afinal, leitor, “mais vale um grama de exemplo do que uma tonelada de palavras”. Por isso – e por muito mais – é que, depois de sorteado o novo relator da operação Lava-Jato, tornou-se quase imperiosa a necessidade de se dispensar logo o sigilo das colaborações premiadas (só as da Odebrecht são 77…). Elas, com certeza, estacarão os vazamentos, que confundem a opinião pública e desservem a Justiça. 

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